Diretor de 'Praia do Futuro' fala sobre trabalho com Wagner Moura. Fato de personagens serem gays não é o mais importante, afirma cineasta.


Antes mesmo da estreia de "Praia do Futuro", o diretor Karim Aïnouz tinha noção de que ter um casal homossexual como protagonista poderia gerar polêmica, especialmente sendo um de seus integrantes Wagner Moura. "As pessoas sempre vão se lembrar do Capitão Nascimento mesmo, não tem jeito. Nunca vão deixar de falar disso, para o bem e para o mal, não importa o que o Wagner faça", resigna-se o cineasta. Mas, assim como o ator, ele ressalta que esse não é o ponto essencial de seu filme.

Durante uma coletiva de imprensa em São Paulo, tanto Aïnouz como Moura e os demais protagonistas, o alemão Clemens Schick e Jesuíta Barbosa, rejeitaram perguntas focadas na sexualidade dos personagens. “Donato é um personagem complexo, ele tem muitos elementos. Ser gay é só um deles", ressaltou Moura, enquanto Barbosa acrescentou que, se alguém se preocupa demais com esse tipo de coisa, não está apto a trabalhar com arte em geral.

E, em entrevista, Aïnouz explicou por que classifica “Praia do Futuro” como um melodrama masculino e por que optou exclusivamente por personagens masculinos.

“Achei que seria bonito se esse melodrama fosse surpreendente. E é bonito ver coisas que você não vê com frequência no cinema, né? É bonito ver um cara chorando, ver alguém fazendo coisas que são humanas. E tinha também o desejo, em última instância. Eu vinha muito de uma toada de fazer filmes sobre personagens femininos. Então queria muito fazer um com personagens masculinos”, diz.


Em “Praia do Futuro”, Aïnouz dirige Wagner Moura pela primeira vez, uma oportunidade que ambos buscavam havia muito tempo. “A gente se conhece há muitos anos, se observa há muitos anos. E eu rapidamente entendi que podia ter outra dinâmica de trabalho com ele, que era a da colaboração mesmo. De eu não ter que ficar o tempo inteiro dizendo ‘faz isso, faz aquilo’. Era uma conversa. E isso foi até a montagem, foi muito legal. O Wagner, na verdade, é um desses parceiros que você vai construindo no decorrer dos anos, é outra categoria. Não é só um ator, é um artista com que você tem uma colaboração”, explica.

No filme, o diretor também explora a ideia de não oferecer respostas prontas. Desde a falta de uma justificativa explícita para a “fuga” de Donato até mesmo o final, em que não se sabe exatamente para onde os personagens estão indo ou o que farão no futuro. “É engraçado, Hitchcock dizia que a gente tinha que repetir as coisas sempre três vezes pro espectador entender. Acho que hoje a gente tem que repetir meia vez, porque o espectador entende muito rápido. Então acho que (no filme) existe também a vontade de se arriscar no terreno de uma narrativa dos nossos tempos”, diz.

“Não sei se deu certo ou não, francamente falando, mas eu estava muito interessado nisso. O cinema em geral está apostando em uma dramaturgia muito previsível, você sabe como vai terminar o filme, você sabe a motivação dos personagens, sabe responder tudo. E é 2014! Acho que é legal com o espectador, é respeitoso com ele, que ele possa imaginar coisas”, justifica.

“Assim, claro que Donato sabe por que foi embora. Mas são várias razões e eu não acho que o cinema seja o melhor lugar pra você enuncia-las. Porque elas são tão difusas... achei que era mais bonito ele simplesmente não saber dizer. E isso é muito importante também para o espectador, para que ele possa imaginar. Acho que o filme todo tem essa aposta no que você pode elipsar e no quanto isso cria um espectador que é mais ativo. Ele consegue se apropriar do filme para que ele seja seu próprio filme. Acho importante que eu te deixe só a sensação da resposta e você possa imaginá-la. Acho isso tão importante! Não só nesse filme, mas no cinema como um todo”, conclui.








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